Marginal
Cristina Carvalho, Planeta Manuscrito, Janeiro 2013
“[…] vá lá a gente
perceber quando é que a gente se engana, quando é que a gente se sente, quando
é que a gente se farta, quando é que tudo se perde” (pág. 129).
Só mesmo, depois. Depois de qualquer coisa. Depois de viver
as situações, depois de viver vida.
Cristina Carvalho, que já nos habituou à diversidade
temática dos seus livros, desta vez senta-nos à mesinha de camilha a
mostrar-nos fotos antigas.
Isto porque “a miúda” do romance encontrou centenas de
negativos de fotografias junto aos sacos de lixo, ao fundo da rua. Levou-os
para casa e mandou revelar uns quantos.
Quando a mãe se deparou com as fotos, reconheceu-as… e
começa a história.
Ao longo de perto de 150 páginas, assistimos ao revelar do
tempo. As memórias que justificam enganos, sentimentos, perdições.
E porque as fotos são diferentes, há as que retratam
situações dramáticas, loucuras juvenis, momentos mais escaldantes, paixões.
“[…] e o teu cabelo
desalinhado e o teu cheiro e o teu tu e o teu eu desgraçava-me completamente,
sem juízo, sem rumo […] (pág. 106).
Lidas as histórias que cada fotografia vai contando,
juntamo-las e deparamos com um pedaço de vida que é a vivência da juventude de
determinada época e lugar. A época situa-se nos anos 60-70; o lugar é a linha
do Estoril.
“Ao longe, perto do
mar, havia luzes a acender e a apagar. Eram luzes furtivas, medrosas.
Pescadores proibidos. Tal com eu que, proibidamente, me furtava ao amor”
(pág. 141).
Não é com as mãos que Cristina Carvalho escreve – é com o
coração.
Sines, 5 de Março de 2013
Joaquim Gonçalves
No comments:
Post a Comment