Como uma flor de plástico
na montra de um talho
Golgona Anghel,
Assírio & Alvim, Maio 2013
De vez em quando, quando passo pela zona da poesia, na
livraria, pego num livro ao acaso, ao acaso o abro e leio um poema. Outras
vezes, escolho mesmo um autor e faço o mesmo, sempre ao acaso.
Como grande parte de nós, na juventude, também eu pensava
que escrevia poesia. Com o tempo, com as leituras, fui-me apercebendo que a
poesia não era bem aquilo que escrevia. Era outra coisa. E fui andando atrás
dessa outra coisa. Sempre atrás. Passei a escrever de outro modo. Talvez mais o
meu modo. Mas não desisti.
Há algum tempo, o crítico, muito crítico, diga-se, António
Guerreiro, visitou a livraria e falámos de autores e editoras, entre outras
coisas.
Quase em simultâneo, saiu no jornal Público uma peça sobre
novos poetas e novas editoras. Entre os novos, porque estamos em Sines, falámos
de Golgona Anghel, já que, para além de ter escrito uma biografia do poeta
sineense Al Berto, editou os seus diários.
Nunca tinha lido nada desta romena radicada em Lisboa.
Surgindo, agora, um no livro seu, com estranho título “Como uma flor de
plástico na montra de um talho”, editado pela Assírio & Alvim, não resisti
à curiosidade.
Como é meu hábito, fui marcando os poemas de que mais
gostava. Mas desisti quando comecei a verificar que estava a marcar todos os
poemas do livro de pouco mais de sessenta páginas.
Em tempo de crise, de revolução moderna, em redes sociais, e
porque a poesia tem, sempre, múltiplas leituras, aqui fica um brinde de Golgona
Anghel, deste seu novo livro (p. 19):
“COMODISTA HESITANTE,
protegido das cabeleireiras
e cliente frequente dos feriados nacionais,
acredita nos encontros fortuitos
assim como um relógio estragado
acredita aproximar-se de uma hora astral.
Estes hábitos podem até ser tolerados
Em contos naturalistas
E reality showers.
Nós, aqui, little
stranger,
Degolamos pardais e fadas de porcelana.
Cobramos interesses à alegria
E vendemos suites com piscina na lua.
A batalha é nossa,
Já alugámos as trincheiras,
Mas custa tanto tirar os pijamas.”
Independentemente do título referir a montra de um talho,
penso que este livro faz jus ao princípio, também poético, de que a poesia é
para comer.
Há mais exemplares na livraria mas este que aqui tenho, na
mão, não o vendo a ninguém. Este é para mim.
Sines, 27 de Maio de 2013
Joaquim Gonçalves
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